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Clementine é o fruto de todo drama da 2º temporada de Walking Dead

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• The Walking Dead - Season Two: All That Remains

Tudo pode mudar em apenas alguns segundos. Um erro, um detalhe não antecipado, e de repente você percebe que não estava preparado para as consequências da sua decisão em uma narrativa tão bem construída.

Antes de ficar preocupado com a chuva de spoilers, saiba que esse é o tipo de review rapidinho que não sai por aí estragando a experiência dos outros. Repito: esse texto não tem spoilers (da segunda temporada, pelo menos).

Na segunda temporada de Walking Dead, a série mais deprimente da Telltale, você acompanha a história de uma Clementine mais velha do que a da temporada passada, agora não mais sob a tutela do seu protetor, Lee. Sobreviver é mais difícil até do que antes, e ela não é mais uma criança. Ela não pode mais. Não quando o seu dia-a-dia é uma luta corrosiva atrás de comida, abrigo, proteção e confiança.

Voltar a Walking Dead é bom, fiquei feliz de ver a Clementine, aquela garotinha sensível mais forte, cuja voz parece mais profunda desde a última vez que nos encontramos. Ela segura uma arma confortavelmente, como se fosse um celular, uma ferramenta de uso diário que se encontra dentro da sua mochila. Há momentos em que você, como Clementine, se sente vagamente protegido e um mundo são. Alguns velhos conhecidos aparecem para dar uma mão. Mas esses são apenas os momentos de felicidade em um cenário sombrio dominado por zumbis.



Antes de começar a jogar, eu estava esperando que a Telltale fosse me mostrar uma Clementine durona. Imaginava que ela seria daquele tipo corajosa o bastante para entrar em buracos escuros para salvar os seus amigos. Meteria um machado na testa de um zumbi sem pensar duas vezes. Pensava que ela teria uma foto do Lee que fosse usada de vez em quando para lembrar o quanto ele teria orgulho dela se estivesse por perto. Mas foi muito diferente jogar com a garota do que sonhar com um arquétipo dela. Ela nunca poderá ser a durona que eu estava imaginando. Claro, ela é corajosa e consegue se virar de um jeito incrível. Mas ela não pode ser tão casca-grossa assim simplesmente porque ela cresceu de um jeito muito problema dada a sua situação: Clementine sempre teve muita ajuda dos outros

Os bonzinhos e benfeitores que a menina conheceu na primeira temporada só queriam ajudá-la. Eles eram praticamente obrigados a dar uma mão. Ela é jovem, afinal de contas, e não tem família. Todos a protegeram desde o começo, antes das coisas ficarem tão ruins quanto na segunda temporada. Era só olhar para a pobrezinha e já imaginar que ela precisava de ajuda. É uma parada instintiva. Isso significa que ela deve sobreviver mais do que grande parte daquelas pessoas. E apesar de que os seus protetores se sacrificam por conta dela, ela provavelmente vai sobreviver acima de todo mundo. Ela terá que viver se lembrando de cada um deles, e como cada um deles também partiu – além de um indigesto sentimento de culpa que a deve remoer também. Ainda mais com o final desse primeiro episódio da nova temporada. Basicamente, aprendemos que é difícil compreender um mundo onde você continua a sobreviver e todos a sua volta acabam morrendo.

Há momentos nesse primeiro episódio em que Clementine está procurando por ferramentas úteis. Você deve lembrar desse mesmo processo na primeira temporada. Você deve andar e clicar por toda uma área em busca de objetos interessantes. Clementine, que substitui Lee no foco da narrativa, irá investigar ou guardar o objeto. Pedi para que ela pegasse uma boneca dentro de uma caixa. Parecia velha e suja, abandonada há anos. Ela ficou olhando por alguns segundos antes de descartar a boneca e deixá-la onde a encontrou, dizendo como aquilo não teria serventia pra ela. Foi nessa hora que eu percebi que a garota realmente tinha mudado, e que o mundo a sua volta também tinha mudado. Ela é uma sobrevivente veterana. Coisas bestas, como brinquedos, não são do seu interesse.

Esse é o tipo de narrativa pelo qual a Telltale se destaca. Apenas um olhar pode transmitir medo, desconfiança, ódio e arrependimento. Clementine vê justamente essas expressões nos rostos dos personagens que ela conhece na segunda temporada. Cada etapa é contextualizada para fazer com que o jogador compreenda tudo, sem ter que ler uma palavra que saia da boca dos personagens. Em vez de simplesmente ouvir passivamente o que os outros têm a dizer, você sente tudo instintivamente.



Na maior parte do tempo, neste episódio Clementine tem que decidir em quem confiar e como fazer com que as pessoas confiem nela. É um tanto absurdo, mas os personagens de Walking Dead estão acostumados a pensar duas vezes antes de confiar em uma garotinha assustada. Isso acaba descrevendo muito bem o tipo de horror que eles presenciaram. Medo e dúvida são sentimentos muito sedutores, ainda mais quando experiências passadas dão crédito a um ceticismo tão severo.

É claro que a Clementine também conhece um monte de idiota nesse primeiro episódio. Em certo momento, um desses cretinos se diz arrependido pela forma como tratou a menina depois que descobre que ela não quer fazer nada de mal. "Espero que você entenda", ele me diz. Eu apenas respondo, "Coisas ruins podem acontecer com qualquer um". Essa simples interação resume muitas das relações que eu construo e destruo em Walking Dead. Não há dúvidas que existam pessoas ruins no mundo. Aqueles que acreditamos apenas consumir o mal e cujos instintos estão voltados para roubar e matar qualquer pessoa que passe pelo seu caminho. Esse é o tipo de gente que vai fazer com que você acredite que a morte é um doce presente comparado com o que eles realmente merecem (e é impressionante como um cuzão qualquer se transforma em um completo psicopata no mundo de Walking Dead).

Mas aprendemos também que nem todo mundo é naturalmente malvado. Muitas pessoas estão apenas assustadas. O comportamento delas pode parecer infundado no começo, mas atrás da desconfiança, existe uma drama e uma história pessoal. Justamente porque coisas ruins podem acontecer com qualquer um. Porque todo mundo em Walking Dead já sofreu algum tipo de traição, ou já perdeu alguém, ou perdeu a confiança de alguém. Essa é apenas a nova condição humana.

Só consegui compreender um pouco desse universo nesse primeiro episódio, mas parece que a Clementine saberá usar sua idade de forma estratégica nessa segunda temporada. Ela bem que poderia usar essa vantagem para convencer as pessoas a confiar nela, ou talvez a Telltale faça com que você convença as pessoas que ela não é uma ameaça. Acredito que muitos personagens vão subestimá-la até o fim dessa série.

Jogar como Clementine era a direção natural e bem pensada na qual Walking Dead deveria seguir. Ela é uma personagem em que investimos emocionalmente desde a primeira temporada, mas agora estamos a conhecendo de um jeito novo. E as experiências pelas quais ela passa são tão únicas devido a sua idade, que agora vamos ver toda uma gama de horror que ficou escondida ou interpretada de uma outra maneira nos primeiros episódios do jogo.



Lembra do jeito que as pessoas olhavam para o Lee? Aquele marmanjo que resolveu proteger uma garotinha desconhecida? O cara que, como alguns descobriram no caminho, tinha uma passado com a polícia? Agora, imagine como essas mesmas pessoas irão olhar agora para Clementine, com o seu boné engraçado e uma pistola a tira colo, depois de sobreviver sozinha durante tanto tempo. É difícil pacas. Talvez seja o mesmo mundo sujo, terrível e cheio de morte que me fez tomar decisões incertas como antes, nas esse The Walking Dead é completamente diferente. Esse jogo é só da Clementine.